Pequenos frascos, grandes perfumes. Seguindo esta máxima tão popular, vamos falando das pequenas jóias portuguesas, escondidas ali pertinho de Lisboa, à vista de todos, mas encerradas em si mesmas.
Enquanto Colares, a jóia do nosso mais recente post, faz vinhos tranquilos, Carcavelos faz 1 do 4 vinhos generosos de Portugal. Sabe quais são os outros 3?
- O centenário e internacionalmente conhecido Porto. Desse nem falo porque tem muita gente gabaritada falando deste vinho por aí;
- O Moscatel de Setúbal que vem conseguindo projeção no Brasil, apoiado por vinícolas gigantes como a Quinta da Bacalhoa e a José Maria da Fonseca. Este vinho fica perfeito com uma magnífica iguaria local, o queijo de Azeitão;
- O injustiçado Madeira para o qual vamos dedicar um post separado porque ele merece.
Depois de irmos a Colares que fica mais ao norte, pertinho de Sintra, fomos a Carcavelos, do ladinho de Cascais, mais ao sul. Porém igualmente perto de Lisboa, meia horinha. A DOC Carcavelos é a menor região vinícola de Portugal e situa-se em torno da freguesia de Carcavelos, nos concelhos de Cascais e de Oeiras. Muito próxima da foz do rio Tejo, a área de vinha da região é bem pequena e urbanizada. Uma boa sugestão de passeio é sair de Lisboa, visitar Carcavelos e suas vinhas para depois almoçar em Cascais, terminando a tarde com uma volta pela praia. Ou até tentar a sorte no Casino Estoril ali do lado.
O Carcavelos é um vinho antigo (séc. XIV) que ganhou reconhecimento internacional com o Marques de Pombal que produzia este vinho na sua quinta em Oeiras lá pelo séc. XVIII. No entanto, foi no reinado de D. José I e sob a forte influência do 1º Conde de Oeiras, Sebastião José de Carvalho e Mello que o vinho de Carcavelos conheceu o seu apogeu. Por isso mesmo, durante muito tempo este vinho foi conhecido como Conde Oeiras, mas devido a um desentendimento com o herdeiro do título, o nome foi modificado para Villa de Oeiras em 2004. Admirado por muitos, o vinho conquistou um adepto ilustre, o Duque de Wellington, que esteve em Portugal comandando as forças militares luso-britânicas, em defesa do exército napoleônico no princípio do séc. XIX. As tropas inglesas levaram consigo o tanto o nome quanto a fama do vinho de Carcavelos, tornando-o conhecido num dos mais importantes mercados internacionais. As qualidades dos vinhos generosos de Carcavelos foram oficialmente reconhecidas em 1907 e um ano depois foram definidos os princípios gerais da sua produção e comercialização.
Porém, o tempo passou e não foi generoso com este vinho. As doenças, a falta de apoio e a urbanização massiva da região provocaram o fechamento de quase todas as quintas da DOC e quase determinaram a extinção do vinho de Carcavelos, não fosse a decisão em 1997 da Câmara Municipal de Oeiras em cooperação com a Estação Agronómica Nacional de apostar na revitalização de uma das velhas quintas da região. Começaram com apenas cerca de 5,5 hectares, plantados em 1984 e planos ambiciosos de não só proteger este patrimônio, mas fazê-lo crescer, inclusive com a recuperação da Quinta do Marquês de Pombal, incluindo a Adega Antiga.

O clima deste terroir é mediterrâneo, temperado e sem grandes amplitudes térmicas devido à proximidade do mar que se pode ver logo ali, pertinho das vinhas. O terreno calcário é voltado para o sul e ventos do norte que subtraem a humidade marítima.
As castas são bastante exóticas, exemplo vivo da riqueza de castas autóctones disponíveis em Portugal.
- Principais castas tintas: Castelão e Preto Martinho, num mínimo de 75%. A Trincadeira e a Rabo de Ovelha podem ser utilizadas até 25%.
- Principais castas brancas: Galego Dourado, Ratinho e Arinto, num mínimo de 75%. A Seara Nova pode ser utilizada só até 25%.
Finalmente o vinho. Este néctar é um vinho generoso (fortificado), cor de topázio, portanto as castas brancas são as mais valorizadas para o vinho de Carcavelos. Um vinho aveludado e persistente, mas delicado com sabores e aromas amendoados, notas de frutas secas, mel e especiarias que adquire um perfume acentuado com o envelhecimento em barricas de carvalho por 10 anos.
O corte é feito com aguardente vínica a 77°, obviamente muito alcoólica mas delicada e que manterá o adocicado do produto final. O vinho descansa por cerca de 9 meses em tanque de inox, nas barricas e depois em garrafa. Dá para sentir porque vale o esforço para salvar esta preciosidade da extinção? O bom é que todo este trabalho culminou no crescimento do terroir cultivado para 12 a 15 hectares. A colheita mais recente deve produzir 60.000 litros e os mercados de exportação retornaram, incluindo Espanha e a antiga cliente, a Inglaterra. Só falta o Brasil.
Eu não podia terminar sem agradecer ao Tiago por sua gentileza em nós receber sem agendamento, bem na época das vindimas com a típica cortesia e boa disposição dos portugueses. Valeu, Tiago. Saúde!
Concordo muito com a matéria escrita ,,aliás o vinho para mim é o melhor fortificado de Portugal,(,minha opinião)..
Acertei 3 dos 4, mas este Carcavelos realmente me foi uma surpresa! Estou ansioso por experimentá-lo!